terça-feira, 22 de outubro de 2013

Eu Só Quero Um Xodó

Eu Só Quero Um Xodó
Anastácia e Dominguinhos
1968

O clássico "Eu Só Quero um Xodó", de Dominguinhos, grande cantor, compositor e sanfoneiro de Garanhuns, Pernambuco, em parceria com a também pernambucana de Recife, Anastácia, sua companheira a época, foi gravado pela primeira vez em 1974. A música já soma mais de 250 regravações em várias línguas, como o inglês, holandês e italiano.

A letra curta e o ritmo contagiante de "Eu Só Quero um Xodó" já foi gravado por vários cantores de estilos diferentes como: Gilberto Gil, Elba Ramalho, Paula Toller, Paul Mauriat, Dóris Monteiro, Daniela Mercury, José Augusto, Karnak, Rita Lee, Zimbo Trio, dentre outros. Além disso, nas suas centenas de gravações, "Eu Só Quero um Xodó" teve várias roupagens, foi gravada como Arrasta-pé, Xote, Reggae e Balada.

Eu comecei compor sozinha desde os 14 anos e nos anos 60 conheci Dominguinhos e nós começamos a fazer música juntos. Eu estava fazendo um programa de televisão em São Paulo e vi um moreno muito simpático. Eu bati o olho e falei: "Eu gostei do moreno!"... e ele era o Dominguinhos. E esse momento passou... três meses depois o Luiz Gonzaga me ligou e disse:
- Olha, eu queria saber se você queria viajar comigo para o Nordeste para abrir o meu show.
Eu falei, "Tô dentro, vamos embora!"
Aí ele falou que iria levar um sanfoneiro para me acompanhar que chamava-se Dominguinhos e que estava precisando de uma força.
Eu falei:
- E é essa força que também eu preciso! (risos)
E na viagem, quando amanhecia, às 09:00 hs, logo após o café, ele começava a tocar. Eu acordava com o som da sanfona. Aí eu fiz uma letra... ele estava tocando algo e eu fiz uma letra que era uma declaração de amor. Eu bati na porta do quarto dele e falei:
- Dominguinhos, você estava tocando uma melodia aí e eu fiz duas letrinhas!
(Anastácia - Cantora e compositora)

Quem me despertou como compositor foi a Anastácia que em 1968 já fez a primeira melodia junto comigo em Aracaju.
(Dominguinhos - Cantor e compositor)

Aí depois disso, evidentemente, nossa relação começou, e era um motivo a mais para a fazermos música. Nós dormíamos juntos, acordávamos juntos, convivíamos... aí qualquer coisinha que ele pegava na sanfona eu já estava incentivada a fazer a letra.
Um dia eu estava preparando um peixinho para o almoço e ele estava tocando sanfona na sala. De repente ele começou a tocar uma melodia e aquela melodia me chegou aos ouvidos muito simpática.
(Anastácia - Cantora e compositora)

Ela pegou um caderninho e já foi fazendo a letra, na mesma hora, e era um "arrasta-pé".
(Dominguinhos - Cantor e compositor)

E a letra encaixou certinha!
(Anastácia - Cantora e compositora)

Eu tenho a impressão que "Eu Só Quero Um Xodó" chegou num momento muito bom. Um momento para mim especial porque ativou novamente a situação da sanfona, do acordeon num modo geral. Devido a Bossa Nova e muitos gêneros que apareciam no Brasil, o acordeon foi ficando obsoleto. Ninguém queria saber de sanfona!
(Dominguinhos - Cantor e compositor)

A música nordestina estava muito por baixo naquele período e o Gilberto Gil chamou Dominguinhos para fazer parte da banda da Gal Costa e para esses shows que eles terian no Midem, uma feira de música que tem em Cannes, na França.
(Antônio Carlos Miguel - Jornalista)

Um pouquinho antes da viagem ele me mostrou a música e me disse: "Olha nego véi, tem essa música aqui que eu gravei...", e eu fiquei logo encantado pela canção, pela estrutura musical, harmônica, o gosto da tradição da música nordestina, do xote, bem presentes alí. E uma letra muito bem armada. E eu comecei a cantar, comecei a botar do meu jeito.
(Gilberto Gil - Cantor e Compositor)

Lá ele começou a cantar nos camarins. Aí ele ficou cantando "Eu Só Quero Um Xodó", cantando do jeito dele, um jeito meio africano e tal... umas coisas muito bonitas que ele fazia na voz. E tinham uns cantores americanos por lá, com a gente, todos empolgados, e o Gilberto Gil disse: "Eu vou é gravar essa música antes que um nêgo desse pegue e desapareca com ela!"
(Dominguinhos - Cantor e compositor)

E quando eu voltei nós resolvemos gravar!
(Gilberto Gil - Cantor e Compositor)

Este aqui foi o compacto que o Gilberto Gil gravou (mostrando o disco na mão). Deste lado "Eu Só Quero Um Xodó", do lado 2, que foi a música que estourou, graças a Deus... e que até hoje está na boca do povo!
(Anastácia - Cantora e compositora)

As músicas que o Gilberto Gil tinha feito sucesso até então era como o autor, e de repente ele faz sucesso como cantor. É o primeiro grande sucesso do Gilberto Gil como intérprete. E muita gente até hoje acha que essa música é dele!
(Rodrigo Faour - Jornalista)

O que o Gilberto Gil imprimiu nessa música, deu esse gás e virou esse sucesso todo!
(Antônio Carlos Miguel - Jornalista)

"Eu Só Quero Um Xodó" está entre os quatro maiores sucessos de rádio e de público da minha carreira!
(Gilberto Gil - Cantor e Compositor)

Foi uma coisa muito boa porque eu e Dominguinhos saímos do sertão. Nós fazíamos muitas músicas... eu fazia muitas letras falando de amor mas focada na minha realidade que é o Nordeste. E de repente esta música começou a tocar, no Brasil inteiro, em qualquer horário. Aí eu disse: "Pronto, eu fiz um sucesso pela primeira vez a nível nacional!". Foi muito bom!
(Anastácia - Cantora e compositora)

Essa coisa toda do "Eu Só Quero Um Xodó" foi que puxou o meu lado compositor musical.
(Dominguinhos - Cantor e compositor)

Foi essa música que revelou o trabalho do Dominguinhos, propiciou que ele dali em diante tivesse condições de apresentar seu repertório, enfim, fazer o trabalho, a carreira que ele fez. Eu tenho a impressão que esta música deu o ponta-pé para este prestígio dele, especialmente como compositor.
(Gilberto Gil - Cantor e Compositor)

As pessoas tinham até essa besteira né: "Ah faz um negocinho parecido com Xodó (risos)... Nunca mais consegui fazer!"
(Dominguinhos - Cantor e compositor)

A nossa parceria foi interrompida porque ele apaixonou-se por outra pessoa. Nós rompemos com o relacionamento, e ficou difícil nos encontrarmos para fazer música. E teve até um ponto nessa confusão toda que eu hoje lamento:
Eu tinha uma caixa cheia de músicas, melodias dele... ele divagava, ele sentava e ia tocando. Comprava caixas e caixas de fita cassete e ficava tocando, gravando, e guardando todas as gravações.
Aí eu fiquei muito irracional quando nos separamos porque eu não estava esperando por isso. E eu fiz um fogueira e queimei aquelas fitas todas. E hoje, até falei pra ele, depois de 25 anos, que foi um ato de que me arrependi muito. Porque tinha ali um material que eu acho que encerraria a minha vida na Terra e não terminaria de fazer, de tanta melodia boa feita por ele.
(Anastácia - Cantora e compositora)

Ela ficou com raiva de mim aí tocou fogo no resto das fitas. Hoje em dia fica pelos cantos reclamando arrependida. Agora... agora... já foi, esqueça isso!
Nós fizemos muitas músicas e tenho certeza que ela foi uma grande parceira musical na minha vida!
(Dominguinhos - Cantor e compositor)

De várias regravações, cada uma tem um estilo. Eu consegui somar 430, 440, por aí, no mundo, em vários idiomas.
(Anastácia - Cantora e compositora)

"Eu Só Quero Um Xodó" entrou em 2005 e eu canto até hoje nos shows. É um dos meus bons momentos dos meus shows. É uma música maravilhosa e que o povo também gosta muito!
(Elba Ramalho - Cantora)

"Eu Só Quero Um Xodó" foi muito mais regravada do que várias outras canções, mas ela é a que tem o carimbo do Gilberto Gil.
(Rodrigo Faour - Jornalista)

Eu acho que a gravação do Gilberto Gil encerrou o assunto. Lógico que sucessos as pessoas gravam e regravam. Mas ninguém chegou perto dessa gravação do Gilberto Gil.
(Antônio Carlos Miguel - Jornalista)

Hoje é difícil você ter uma gravação dessas, como "Eu Só Quero Um Xodó", nas paradas de sucesso. Uma música que está há 40 anos e que todo mundo se lembra. Qualquer pessoa que puxe esta música todo mundo vai cantar numa rodinha de violão, onde quer que seja, vai passando de geração para geração, uma música que não morre!
(Rodrigo Faour - Jornalista)

Ela transcende porque ela ocupa todos os tempos, ela sobrevive a todos os tempos e ocupa todos os espaços. Os espaços físicos e os espaços da emoção!
(Elba Ramalho - Cantora)

Se tornou um Xodó na minha vida. Então eu tenho esta ligação afetiva com a canção. Ela é uma das minhas canções de travesseiro!
(Gilberto Gil - Cantor e Compositor)

"Eu Só Quero Um Xodó" de qualquer forma me ajudou e me ajuda até hoje. Quando quiser, eu toco! (risos)
(Dominguinhos - Cantor e compositor)

Para conhecer mais sobre a vida e obra de Dominguinhos visite o blog Famosos Que Partiram.



Eu Só Quero Um Xodó

Que falta eu sinto de um bem
Que falta me faz um xodó
Mas como eu não tenho ninguém
Eu levo a vida assim tão só...

Eu só quero um amor
Que acabe o meu sofrer
Um xodó pra mim
Do meu jeito assim
Que alegre o meu viver

Que falta eu sinto de um bem
Que falta me faz um xodó
Mas como eu não tenho ninguém
Eu levo a vida assim tão só...

Eu só quero um amor
Que acabe o meu sofrer
Um xodó pra mim
Do meu jeito assim
Que alegre o meu viver...

Fonte: Por Trás da Canção

Quem Sabe?

Quem Sabe?
Música de Carlos Gomes
Letra de Bittencourt Sampaio
1859

"Quem Sabe?" é uma das maiores pérolas do cancioneiro popular. Foi composta pelo maestro Carlos Gomes. Com letra do jornalista Bittencourt Sampaio, é uma de suas mais famosas composições até hoje, gravada com sucesso por Francisco Petrônio e Dilermando Reis, tendo sido incluída na trilha sonora da telenovela "Senhora", produzida pela TV Globo em 1975 e inspirada no romance homônimo de José de Alencar.

"Quem Sabe?" embalou centenas e centenas de saraus pelo Brasil. A melodia é de uma suavidade impressionante. A letra é delicada. Tudo nela é sonoro.

Em 1859, o Brasil ainda era um Império, regido por Dom Pedro II, que tinha 39 anos. Nesse ano, Antônio Carlos Gomes compôs "Quem Sabe?", uma das primeiras e mais famosas modinhas. Carlos Gomes tinha somente 23 anos quando compôs "Quem Sabe?". Era órfão de mãe, que havia sido assassinada, e criado pelo pai, com muitas dificuldades.

A época de Carlos Gomes foi onde o Nacionalismo e o Romantismo davam o tom das obras literárias e musicais. Os ídolos de Carlos Gomes foram Giuseppe Verdi e Almeida Garrett. O Romantismo tinha por características a melancolia e o pessimismo, o chamado "mal-do-século".

Na música "Quem Sabe?", há um verso, "dá a saudade agro tormento", que pode muito bem representar o pessimismo exacerbado que tomava conta das pessoas cultas, àquela época.

Para conhecer mais a obra de Carlos GomesFrancisco PetrônioDilermando ReisJosé de Alencar e Dom Pedro II citados neste texto, acesse o blog Famosos Que Partiram.



Quem Sabe?

Tão longe, de mim distante
Onde irá, onde irá o teu pensamento
Tão longe, de mim distante
Onde irá, onde irá o teu pensamento

Quisera saber agora
Quisera saber agora
Se esqueceste, se esqueceste
Se esqueceste o juramento

Quem sabe se és constante?
Se ainda é meu, teu pensamento
Minh'alma toda devora
Da saudade, da saudade agro tormento

Tão longe, de mim distante
Onde irá, onde irá o teu pensamento
Quisera saber agora
Se esqueceste, se esqueceste o juramento

Quem sabe se és constante?
Se ainda é meu teu pensamento
Minh'alma toda devora
Da saudade agro tormento

Vivendo de ti ausente
Ai meu Deus, ai meu Deus que amargo pranto
Vivendo de ti ausente
Ai meu Deus, ai meu Deus que amargo pranto

Suspiros, angustias, dores
Suspiros, angustias, dores
São as vozes, são as vozes
São as vozes do meu canto

Quem sabe? Pomba inocente
Se também te corre o pranto
Minh'alma cheia d'amores
Te entreguei já n'este canto

Vivendo de ti ausente
Ai meu Deus, ai meu Deus que amargo pranto
Suspiros, angustias, dores
São as vozes, São as vozes do meu canto

Quem sabe? Pomba inocente
Se também te corre o pranto
Minh'alma cheia d'amores
Te entreguei já n'este canto

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

Faroeste Caboclo

Faroeste Caboclo
Renato Russo
1979

"Faroeste Caboclo" é uma canção do grupo brasileiro Legião Urbana, composta pelo compositor e líder da banda, Renato Russo. Composta em 1979, ela só foi lançada oficialmente em 1987, no álbum "Que País é Este 1978/1987" e já era velha conhecida dos amigos de Renato Russo. A música foi escrita quando o jovem Renato Russo se apresentava por Brasília como "Trovador Solitário": só ele, um banquinho e um violão.

O álbum "Que País é Este 1978/1987" reunia sete canções antigas, da época de "Trovador Solitário" e de "Aborto Elétrico", e apenas duas inéditas, "Angra dos Reis" e "Mais do Mesmo".

Ganhou bastante atenção quando do lançamento do álbum e, por isso, mereceu ser lançada como single promocional, o que só aconteceu em 1988 devido à necessidade de editar a canção para a aprovação pela censura federal.

A canção foi censurada para radiofusão por conter "referências a drogas e linguagem grosseira e vulgar", conta o jornalista Carlos Marcelo na biografia "Renato Russo - O Filho da Revolução", cuja nova edição sairá com ensaio sobre "Faroeste Caboclo".

As rádios começaram, então, a tocar uma versão com cortes em partes como "comia todas as menininhas da cidade", "que fica atrás da mesa com o cu na mão" e "olha pra cá, filha da puta sem vergonha".

Renato Russo afirmou na época que a estrutura de "Faroeste Caboclo" foi inspirada em "Hurricane", sucesso épico de Bob Dylan sobre um boxeador condenado à prisão, e em "Domingo no Parque", de Gilberto Gil.

Em 2013, a canção ganhou uma adaptação cinematográfica, dirigida por René Sampaio, com roteiro de Victor Atherino e Marcos Bernstein a partir da letra original, e tendo nos papéis principais os atores Fabrício Boliveira (João de Santo Cristo), Ísis Valverde (Maria Lúcia), Felipe Abib (Jeremias) e César Troncoso (Pablo).


Histórico e Estrutura

"Faroeste Caboclo" narra a história de João de Santo Cristo, um traficante nascido no Nordeste do Brasil (supostamente no interior da Bahia) que se muda para Brasília e se redime ao apaixonar-se por uma mulher chamada Maria Lúcia, sendo posteriormente assassinado por Jeremias, um traficante rival.

A canção tem 168 versos. Segundo o jornalista e historiador Marcelo Fróes, no manuscrito original com a letra de "Faroeste Caboclo" havia uma anotação de Renato Russo dizendo que imaginava a música como um baião cantado por Luiz Gonzaga. Apesar da duração incomum para uma canção popular, 9'03", há duas outras composições de Renato Russo ainda mais extensas: "Metal Contra as Nuvens" (11'22") e "Clarisse" (10'32").


Lançamento

A canção foi censurada, junto com "Conexão Amazônica", do mesmo disco, mas por razão diferente: a presença de palavrões, enquanto "Conexão Amazônica" foi censurada por causa da temática, sobre o tráfico de drogas. Porém, em "Faroeste Caboclo", foi feita uma edição onde se colocou um sinal sonoro sobre os palavrões. Com isso, a música foi liberada para radiodifusão.


Frases Sobre a Letra

"Eu acho legal que as pessoas gostem da história. Um motorista de táxi, outro dia, me disse que tinha um amigo que comprou a fita porque era, exatamente, a história do irmão dele. O cara tinha saído de Mato Grosso e ido a Brasília, e morreu num tiroteio no Nordeste. E a canção é totalmente fictícia."
(Renato Russo, 1988)

"Acho que Faroeste Caboclo é uma mistura de 'Domingo no Parque' de Gilberto Gil, e coisas do Raul Seixas com a tradição oral do povo brasileiro. Brasileiro adora contar história. E eu também queria imitar o Bob Dylan. Eu queria fazer a minha 'Hurricane'."
(Renato Russo, 1990)

"Lembro quando ele me mostrou a música, em umas férias na Ilha do Governador, RJ. Ele tinha um caderno cheio de letras ainda não gravadas, que depois foram surgir com a Legião."
(Helena Lemos, irmã mais nova de Fê e Flávio Lemos, do Capital Inicial)

Philippe Seabra, vocalista da banda Plebe Rude, também presenciou os primeiros dias daquela que se tornaria uma das músicas mais famosas do rock brasileiro.

"Renato tocou 'Faroeste Caboclo' para mim debaixo de um bloco em Brasília", lembra. "A música era muito forte."

"A música é a história do Brasil, é um hollywoodão, cheio de clichês do país. Quando ouvi, pensei: 'É um filme'. Tanto é que acabou virando isso mesmo", disse Marcelo Bonfá, baterista da banda.



Faroeste Caboclo

Não tinha medo o tal João de Santo Cristo
Era o que todos diziam quando ele se perdeu
Deixou pra trás todo o marasmo da fazenda
Só pra sentir no seu sangue o ódio que Jesus lhe deu

Quando criança só pensava em ser bandido
Ainda mais quando com um tiro de soldado o pai morreu
Era o terror da sertania onde morava
E na escola até o professor com ele aprendeu

Ia pra igreja só pra roubar o dinheiro
Que as velhinhas colocavam na caixinha do altar
Sentia mesmo que era mesmo diferente
Sentia que aquilo ali não era o seu lugar

Ele queria sair para ver o mar
E as coisas que ele via na televisão
Juntou dinheiro para poder viajar
De escolha própria, escolheu a solidão

Comia todas as menininhas da cidade
De tanto brincar de médico, aos doze era professor.
Aos quinze, foi mandado pro o reformatório
Onde aumentou seu ódio diante de tanto terror.

Não entendia como a vida funcionava
Discriminação por causa da sua classe e sua cor
Ficou cansado de tentar achar resposta
E comprou uma passagem, foi direto a Salvador.

E lá chegando foi tomar um cafezinho
E encontrou um boiadeiro com quem foi falar
E o boiadeiro tinha uma passagem e ia perder a viagem
Mas João foi lhe salvar

Dizia ele: "Estou indo pra Brasília
Neste país lugar melhor não há
Tô precisando visitar a minha filha
Eu fico aqui e você vai no meu lugar"

E João aceitou sua proposta
E num ônibus entrou no Planalto Central
Ele ficou bestificado com a cidade
Saindo da rodoviária, viu as luzes de Natal

"Meu Deus, mas que cidade linda,
No Ano-Novo eu começo a trabalhar"
Cortar madeira, aprendiz de carpinteiro
Ganhava cem mil por mês em Taguatinga

Na sexta-feira ia pra zona da cidade
Gastar todo o seu dinheiro de rapaz trabalhador
E conhecia muita gente interessante
Até um neto bastardo do seu bisavô

Um peruano que vivia na Bolívia
E muitas coisas trazia de lá
Seu nome era Pablo e ele dizia
Que um negócio ele ia começar

E o Santo Cristo até a morte trabalhava
Mas o dinheiro não dava pra ele se alimentar
E ouvia às sete horas o noticiário
Que sempre dizia que o seu ministro ia ajudar

Mas ele não queria mais conversa
E decidiu que, como Pablo, ele ia se virar
Elaborou mais uma vez seu plano santo
E sem ser crucificado, a plantação foi começar.

Logo logo os maluco da cidade souberam da novidade:
"Tem bagulho bom ai!"
E João de Santo Cristo ficou rico
E acabou com todos os traficantes dali.

Fez amigos, frequentava a Asa Norte
E ia pra festa de rock, pra se libertar
Mas de repente
Sob uma má influência dos boyzinho da cidade
Começou a roubar.

Já no primeiro roubo ele dançou
E pro inferno ele foi pela primeira vez
Violência e estupro do seu corpo
"Vocês vão ver, eu vou pegar vocês"

Agora o Santo Cristo era bandido
Destemido e temido no Distrito Federal
Não tinha nenhum medo de polícia
Capitão ou traficante, playboy ou general

Foi quando conheceu uma menina
E de todos os seus pecados ele se arrependeu
Maria Lúcia era uma menina linda
E o coração dele pra ela o Santo Cristo prometeu

Ele dizia que queria se casar
E carpinteiro ele voltou a ser
"Maria Lúcia pra sempre vou te amar
E um filho com você eu quero ter"

O tempo passa e um dia vem na porta
Um senhor de alta classe com dinheiro na mão
E ele faz uma proposta indecorosa
E diz que espera uma resposta, uma resposta do João

"Não boto bomba em banca de jornal
Nem em colégio de criança isso eu não faço não
E não protejo general de dez estrelas
Que fica atrás da mesa com o cu na mão

E é melhor senhor sair da minha casa
Nunca brinque com um Peixes de ascendente Escorpião"
Mas antes de sair, com ódio no olhar, o velho disse:
"Você perdeu sua vida, meu irmão"

"Você perdeu a sua vida meu irmão
Você perdeu a sua vida meu irmão
Essas palavras vão entrar no coração
Eu vou sofrer as consequências como um cão"

Não é que o Santo Cristo estava certo
Seu futuro era incerto e ele não foi trabalhar
Se embebedou e no meio da bebedeira
Descobriu que tinha outro trabalhando em seu lugar

Falou com Pablo que queria um parceiro
E também tinha dinheiro e queria se armar
Pablo trazia o contrabando da Bolívia
E Santo Cristo revendia em Planaltina

Mas acontece que um tal de Jeremias,
Traficante de renome, apareceu por lá
Ficou sabendo dos planos de Santo Cristo
E decidiu que, com João ele ia acabar

Mas Pablo trouxe uma Winchester-22
E Santo Cristo já sabia atirar
E decidiu usar a arma só depois
Que Jeremias começasse a brigar

Jeremias, maconheiro sem-vergonha
Organizou a Rockonha e fez todo mundo dançar
Desvirginava mocinhas inocentes
Se dizia que era crente mas não sabia rezar

E Santo Cristo há muito não ia pra casa
E a saudade começou a apertar
"Eu vou me embora, eu vou ver Maria Lúcia
Já tá em tempo de a gente se casar"

Chegando em casa então ele chorou
E pro inferno ele foi pela segunda vez
Com Maria Lúcia Jeremias se casou
E um filho nela ele fez

Santo Cristo era só ódio por dentro
E então o Jeremias pra um duelo ele chamou
Amanhã às duas horas na Ceilândia
Em frente ao lote 14, é pra lá que eu vou

E você pode escolher as suas armas
Que eu acabo mesmo com você, seu porco traidor
E mato também Maria Lúcia
Aquela menina falsa pra quem jurei o meu amor

E o Santo Cristo não sabia o que fazer
Quando viu o repórter da televisão
Que deu notícia do duelo na TV
Dizendo a hora e o local e a razão

No sábado então, às duas horas,
Todo o povo sem demora foi lá só para assistir
Um homem que atirava pelas costas
E acertou o Santo Cristo, começou a sorrir

Sentindo o sangue na garganta,
João olhou pras bandeirinhas e pro povo a aplaudir
E olhou pro sorveteiro e pras câmeras e
A gente da TV que filmava tudo ali

E se lembrou de quando era uma criança
E de tudo o que vivera até ali
E decidiu entrar de vez naquela dança
"Se a via-crucis virou circo, estou aqui"

E nisso o sol cegou seus olhos
E então Maria Lúcia ele reconheceu
Ela trazia a Winchester-22
A arma que seu primo Pablo lhe deu

"Jeremias, eu sou homem. coisa que você não é
E não atiro pelas costas não
Olha pra cá filha-da-puta, sem-vergonha
Dá uma olhada no meu sangue e vem sentir o teu perdão"

E Santo Cristo com a Winchester-22
Deu cinco tiros no bandido traidor
Maria Lúcia se arrependeu depois
E morreu junto com João, seu protetor

E o povo declarava que João de Santo Cristo
Era santo porque sabia morrer
E a alta burguesia da cidade
Não acreditou na história que eles viram na TV

E João não conseguiu o que queria
Quando veio pra Brasília, com o diabo ter
Ele queria era falar pro presidente
Pra ajudar toda essa gente que só faz...

Sofrer...


domingo, 4 de agosto de 2013

Cantores do Rádio

Cantores do Rádio
Alberto Ribeiro, Braguinha e Lamartine Babo
1936

A música "Cantores do Rádio" foi composta por Alberto Ribeiro, João de Barro, o Braguinha, e Lamartine Babo.

"Segundo o pesquisador Suetônio Soares Valença, a marcha 'Cantores do Rádio' foi composta dentro de um ônibus, depois de uma noitada em que os três haviam perdido todo o dinheiro apostado no Cassino da Urca. Entusiasmado com a canção concebida no banco de trás do lotação, o trocador teria dispensado-os dos vinténs da passagem."

"Cantores do Rádio" representou a primeira e única vez na qual as irmãs Carmen Miranda e Aurora Miranda apareceram juntas em um filme. Elas interpretaram a canção, enorme sucesso gravado em 1936, no filme "Alô, Alô, Carnaval".

Além de estar presente na trilha sonora do filme "Alô, Alô, Carnaval", esteve também na trilha do filme "Quando o Carnaval Chegar", interpretada por Chico Buarque, Maria Bethânia e Nara Leão (1972).



Cantores do Rádio

Nós somos as cantoras do rádio
Levamos a vida a cantar
De noite emabalamos teu sono
De manhã nós vamos te acordar

Nós somos as cantoras do rádio
Nossas canções, cruzando um espaço azul,
Vão reunindo
Num grande abraço
Corações de norte a sul

Canto pelos espaços afora
Vou semeando cantigas
Dando alegria a quem chora

Canto pois sei
Que a minha canção
Faz estancar a tristeza que mora
No teu coração

Canto pra te ver mais contente
Pois a ventura dos outros
É a alegria da gente

Canto e sou feliz só assim
E agora peço que cantem
Um pouquinho pra mim


segunda-feira, 8 de julho de 2013

Sozinho

Sozinho
Peninha
1995

A música "Sozinho", escrita pelo compositor Peninha, nasceu com alma feminina, com o título de "Sozinha" e gravada pela primeira vez pela cantora Sandra de Sá.

Caetano Veloso regravou a canção em 1998, adaptando o título para o gênero masculino. A versão explodiu nas rádios brasileiras, com o álbum "Prenda Minha" atingindo a marca de 1 milhão de cópias vendidas.

Peninha escreveu a canção inspirado na filha, Clariana Alves, que tinha 14 anos e sofria por um namorado que a deixava muito só. Um dia, sem querer, ele escutou uma conversa da filha com o namorado ao telefone e, com o violão, fez a música, baseado na solidão que ela estava sentindo.

Clariana Alves só soube que foi a musa inspiradora da canção anos depois, quando Peninha passou a contar a história da canção em entrevistas, por causa da gravação de Caetano Veloso. Antes disso, o pai sempre dizia que a música era "a cara dela", o que a deixava brava, por achar que ele estava tentando lhe dizer que seu relacionamento era ruim. Depois, ela percebeu que ele passou na letra uma preocupação com ela.

O de Clariana, entre idas e vindas, durou mais de 5 anos. Clariana conta que sempre que o casal brigava, o namorado colocava a música e lhe dizia: "Pense bem". Em uma das vezes que terminaram, ele foi até a casa dela colocou o CD do Caetano Veloso no modo repeat. Ela ouviu a música a noite inteira e acabou voltando.

A música marcou tanto o casal, que, mesmo depois de separados, o ex-namorado ligava para Clariana toda vez que ouvia a música.

"Nossos amigos chamam ele de 'Sozinho'. Ele sempre fala que, se a gente não casar, eu vou estar velhinha e me lembrar dele toda vez que ouvir essa música. Pior é que vou. Nem que eu queira esquecer, vou conseguir."
(Clariana Alves)

"Esta música foi baseada numa ligação, numa briga minha com um namoradinho de infância. E pelo que eu me lembro, eu estava na casa do meu pai e ele ouviu na extensão."
(Clariana Alves)

"Ela estava falando ao telefone mas não estava legal... tinha alguma coisa rolando ali."
(Peninha)

"Eu acho que o meu pai pescou esse desgaste no relacionamento de uma menina de 14, 15 anos, e fez esta música."
(Clariana Alves)

"Esta música foi baseada num sentimento de solidão da minha filha Clariana. Eu não lembro exatamente em que ano eu fiz esta música. Eu lembro que foi no bairro da Aclimação, só com um violão... aliás, foi com esse violão aqui que eu fiz 'Sozinho' (mostrando o violão). Como eu fiz esta música baseada no sentimento dela, eu achei que tinha feito uma música teen."
(Peninha)

"Eu conheci o Peninha quando ele mandou há vários anos atrás uma música chamada 'Alma Gêmea' pro Fábio Jr. No disco seguinte que eu fiz do Fábio, eu imediatamente liguei para o Peninha e pedi pra ele, lógico: 'Peninha me manda uma música, eu preciso de uma música pro Fábio, pelo amor de Deus!'... e o Peninha me mandou 'Sozinho'."
(Guto Graça Melo – Produtor Musical)

"O Guto Graça Melo é um anjo na minha vida. E eu nem gostava muito dessa onda de mostrar música assim. Eu mandava a música porque aí se o cara não gosta não fica chato do cara falar, ficar olhando pra sua cara... 'Pô achei mais ou menos...'"
(Peninha)

"Não sei se o Fábio estava num mal dia... eu não sei o que aconteceu, mas ele não se ligou na música.
Fábio Jr: Não... não... não...  isso não... não é isso não!
Guto: Essa música é um hit Fábio, se você não quer gravar, não tem o menor problema!
O disco seguinte que eu produzi  foi da Sandra de Sá."
(Guto Graça Melo - Produtor Musical)

"O Guto Graça Melo me chegou com uma fita do Peninha tocando uma música no violão e fez a música 'Sozinha'. Inclusive eu me debato muito quando falam:  Ah vai cantar 'Sozinho'?. E eu respondo: 'Não, eu vou cantar ‘Sozinha’... o Tim e o Caetano cantam ‘Sozinho’, inclusive a real da música é essa!”
(Sandra de Sá)

"Eu estava sem grana, sem nada, ninguém olhava pra minha cara e tudo quanto é porta fechada. Nessa fase, que foi uma fase muito terrível porque eu tinha minhas obrigações, tinha meus filhos estudando... eu recomecei a recuperar o compositor que eu acho que tinha esquecido... sei lá onde é que eu deixei o cara!... E nessa onda pintou ‘Sozinho’.

A música ‘Sozinho’ mudou a minha vida pra sempre. Eu ficava pensando: Pô, tem alguma coisa que eu não sei mas que dá certo aí. Eu gostaria de ter a receita para que todas as músicas que eu fizesse, fizessem sucesso."
(Peninha)

"E essa música fez com que a Sandra de Sá que estava com a vendagem naquela ocasião extremamente baixa, passasse a vender... se não me engano a venda oficial na época foi de 800 mil discos."
(Guto Graça Melo – Produtor Musical)

"'Sozinha' trouxe pra mim muita coisa bacana. Primeiro que explodiu, vendeu muito CD, eu fiz muitos shows. Mas sinceramente, sem demagogia nenhuma, o presente maior que ‘Sozinha’ me deu foi no dia 24 de dezembro daquele ano... tô dirigindo na Avenida Brasil, atendo o telefone, era o Peninha me agradecendo pelo Natal que ele estava tendo. Então... papo de alfândega: Nada a declarar... mas foi legal ele ter me ligado no dia 24 e... (emocionada) foi legal!"
(Sandra de Sá - Cantora)

"Certamente foi um Natal diferente... legal ela lembrar disso, eu lembro também, faz muito tempo. Fiquei feliz agora em saber que ela lembrou!
Eu estava feliz já, estava bom. Mas aí começaram a acontecer mais coisas com a música, entendeu? E a música começou a andar!"
(Peninha)

"Passou-se um tempo, eu recebo um telefonema, a música já estourada, do Tim Maia:
- Gutão, é o Tim.
- Fala rapaz!
- Guto essa música da Sandra é muito legal, eu vou gravar.
- Pô, que barato! Fala com o Peninha, liga pra ele, avisa a ele!"
(Guto Graça Melo – Produtor Musical)

"Eu cheguei em casa e recebi o recado: 

- O Tim Maia ligou pra você!
Eu falei: Pô é sacanagem de alguém!
Aí um dia eu atendi e era o Tim Maia bicho. Ele acabou gravando a música e falou:
- Eu gravei a música no tom da Sandra.

Mas aí a música continuou andando, crescendo... tinha vida própria a música! O que eu fazia? Só assistia o filme."
(Peninha)

"Aquele lance que a gente tem no Brasil né: Dependendo de quem grava, a música é uma parada. Então eu gravei ‘Sozinha’ e explodiu. Quem não cantava ‘Sozinha’ né?
Aí o Caetano gravou 'Sozinho'... aí teve um dia que eu estava cantando 'Sozinha' uma pessoa falou:
- Ué você também gravou essa música?
Eu falei: Ahhhh vá sacanear outro porra! (Risos)"
(Sandra de Sá)

"Você vai comparar Sandra com Tim Maia, com Caetano Veloso... é uma coisa meio... A Sandra é a Sandra, o Caetano é o Caetano e o Tim é o Tim, são três coisas muito legais. Se você pensar a grosso modo, a Sandra parece um pouco com o Tim. Tanto é que a cantora da vida do Tim é a Sandra de Sá, ele falava isso... pra mim ele falou isso!
Então eles se parecem um pouco, mas não dá pra comparar uma coisa com outra assim.  Eu fiquei muito feliz quando a Sandra gravou esta música e fez sucesso com essa música. Fiquei muito feliz quando o Tim Maia gravou esta música porque eu queria muito gravar com Tim Maia. E quando o Caetano gravou esta música eu desmaiei umas cinco vezes porque foi uma coisa assim muito grande!
O Caetano fez a leitura da música uma vez só, não tem uma repetição da música... e foi o suficiente assim!"
(Peninha)

"Com esta gravação Caetano alcançou a marca de 1 milhão de discos, coisa que eu acho que ele nunca tinha tido antes. E dali pra frente ele, além do cantor cult, do cantor maravilhoso, genial que sempre foi, virou cantor popular mesmo, em termos de venda!"
(Guto Graça Melo – Produtor Musical)

"O compositor faz uma música, ele quer que a música seja bem gravada, que faça sucesso. Esse realismo, quando ele vai... percebe que as pessoas realmente gostam daquela música, e aquela música se torna importante na vida das pessoas.
Com ‘Sozinho’ eu ganhei um prêmio máster... aí quando eu cheguei lá é que eu vi a importância do ‘trem’!
Aqui é o disco de diamante do Caetano. Na verdade houve uma festa e ele recebeu o disco de diamante. Aí ele teve a gentileza de fazer dois. Ele recebeu um e aí ele me deram um que eu guardo aqui com muito carinho.
Ele está falando assim ó: "Valeu Peninha!" (Referindo-se a foto do Caetano na capa do disco)
Sozinho quando entrou na novela 'Suave Veneno', já era um sucesso e aí virou mais sucesso ainda. Talvez seja por isso que tenha vendido tanto. Acho que essa novela teve a ver com isso!"
(Peninha)

"A novela quer uma música que contenha a emoção da personagem. Quando essa emoção da personagem bate com a letra dessa música e com essa gravação... quando esse fenômeno acontece, isso potencializa de uma forma... aí realmente você tem um grande sucesso e o grande fenômeno."
(Guto Graça Melo – Produtor Musical)

"Eu acho que 'Sozinha' se comunica com o geral porque é real, é de verdade. Eu acho que tudo que é real, tudo que é de verdade... pode ser a parada mais mirabolante do mundo, mas se for de verdade, se for real... muita, mais muita gente vai se identificar, vai gostar e vai fazer bem!"
(Sandra de Sá)

"Com o tempo eu descobri que ela não é uma música teen como eu imaginei. Ela é uma música que fala que se você não cuidar do que você tem, você dança... é isso que a música fala... você não tá cuidando bem de mim pô, eu tô dormindo mal... eu tô juntando o passado, presente e futuro e tá ruim aqui... não tô gostando disso... daqui a pouco vai chegar alguém... e eu vô embora!"
(Peninha)

"Quando a gente gosta é claro que a gente cuida é a maior verdade. E foi isso que me fez enxergar que o relacionamento não era o que eu esperava, e realmente botar um fim nisso."
(Clariana Alves)

"Eu acho que diz muito... quando você diz: 'Porque você me deixa tão solta? Porque você não cola em mim? Tô me sentindo muito sozinha... e se de repente rolar uma outra pessoa?'. Isso é uma história: Princípio, meio e vida! (risos)
Hoje em dia nos shows ela está altamente funk’n roll, rock’n soul (risos), tá muito assim. E o Tim gravou numa outra parada, foi um lance mais baladão... o Caetano com aquela doçura dele, fora as gravações que a gente não conhece!"
(Sandra de Sá)

"Já ouvi o Belo cantando essa música, já ouvi o Daniel, Sérgio reis, o Fábio Jr, Mastruz Com Leite... tem muita coisa de 'Sozinho'. A Nely Furtado não gravou a música. Eu até gostaria pois aí seriam mais 10 milhões de cópias computadas. Mas na verdade ela veio ao Brasil fazer uns shows aqui e a música brasileira que ela escolheu para cantar foi 'Sozinho'".
(Peninha)

"A letra desta música é fácil de dizer entendeu? Ela é fácil de ser sincera. Qualquer cantor que cante vai ser sincero com aquele jeitinho de cantar."
(Guto Graça Melo – Produtor Musical)

"É um presente que eu tenho até hoje, porque até hoje quando eu canto 'Sozinha' no show é... fogo. Todo mundo gosta, todo mundo canta!"
(Sandra de Sá)

"Quando eu canto essa música assim... por aí... impressionante, ela está aí. Eu acho que eu vou morrer e ela vai ficar, o que é legal!"
(Peninha)

"'Sozinha' tá muito bem acompanhada! (Risos)"
(Sandra de Sá)


Sozinho

Às vezes no silêncio da noite
Eu fico imaginando nós dois
Eu fico ali sonhando acordado
Juntando o antes, o agora e o depois

Por que você me deixa tão solto?
Por que você não cola em mim?
Tô me sentindo muito sozinho

Não sou nem quero ser o seu dono
É que um carinho às vezes cai bem
Eu tenho os meus desejos e planos secretos
Só abro pra você mais ninguém

Por que você me esquece e some?
E se eu me interessar por alguém?
E se ela, de repente, me ganha?

Quando a gente gosta
É claro que a gente cuida
Fala que me ama
Só que é da boca pra fora

Ou você me engana
Ou não está madura
Onde está você agora?

Quando a gente gosta
É claro que a gente cuida
Fala que me ama
Só que é da boca pra fora

Ou você me engana
Ou não está madura
Onde está você agora?


Fonte: Por Trás da Canção

sábado, 1 de junho de 2013

Olhos Coloridos

Olhos Coloridos
Macau
Início Década de 70

"Olhos Coloridos" nasceu de uma manifestação que aconteceu comigo numa situação social. Um amigo meu me convidou para assistir uma exposição escolar no Estádio de Remo no início dos anos 70. E aí eu achei legal... as crianças brincando, as professoras, e tudo... e fiquei apreciando!

Só que naquela época, nos inícios dos anos 70, a gente era muito "underground". A maneira de vestir, o cabelo... era muito mais normal: Acordava e mexia com o cabelo, ficava enrolando com o dedo assim e tal... e ele ia criando sua forma bem caverna. E as roupas eram rasgadas aqui... sandália... do jeito que eu queria vestir. Eu nem me olhava no espelho. Lavava o rosto, botava "o que tava", e tudo bem né!

E eu tava com meu colega e daqui a pouco me apareceu um soldado... assim do nada, de repente:


- Você quer me acompanhar?

Aí eu olhei assim...

- Como assim? Acompanhar pra onde? 
- Quer me acompanhar?
- Não, mas o Srº tem que me explicar porque eu tenho que lhe acompanhar!
- Olha, eu não vou te responder não bicho, você tem que me acompanhar se não eu vou te levar a força!
- Então eu não vou não. Se você não me explicar... eu não estou fazendo nada, eu estou com meu colega aqui, a gente veio ver uma exposição, estou admirando, vendo as crianças, as professoras! Qual é o motivo?

E ele me levou à força. Rapidamente me empurrou e me largou na área militar... e tinha um tenente também que disse:

- Olha eu estava te observando daqui... você é muito folgado!
- Eu não sou folgado não. Eu estou falando o que é do meu direito:  Porque eu estou aqui? O que eu cometi? Qual o crime que eu cometi para estar aqui?
- Você não tem que responder nada, tá entendendo? Se ele teve que pegar você, você tinha que vir!
- Não, não é assim não...?
- Você fala demais cara... com esse cabelo enrolado, olha sua roupa como é que tá! Olha a sandália e tudo!
- O que é que tem o meu cabelo? O que é que tem a minha roupa? Eu não estou andando nu! Essa é a minha roupa que estou usando... tranquilo como todo mundo moderno usa. Qual é o problema?
- O problema é que você é um crioulo muito folgado!
- Olha... crioulo eu não sou não, eu sou negro. Mas o sangue que corre na sua veia, corre igual na minha, é vermelho. Então você é sarara crioulo!

Aí ele ficou furioso e me agrediu com um tapa e disse:

- Leva ele!

Aí um outro soldado falou:

- Leva ele pra onde?
- Pra onde vocês quiserem!

Macau e Sandra de Sá
E aquilo me assustou, me deixou assim meio apavorado. E eu pensei: vão me matar! E me colocaram numa prisão provisória. Era como se fosse um presídio porque não tinha vaga... me colocaram ali.  É uma emoção tão grande falando assim, que é realmente doloroso isso, você passar por uma situação dessa!

Quando de repente escutei:

- Macau!

Ahhh meu Deus do céu, pintou uma salvação! (Pensei)

- Sou eu, vamos embora Macau, pra casa!
- Não, eu não vou pra casa não!

- Você vai pra onde?
- Ah não sei, acho que eu vou até a praia... não sei... deixa eu ficar sozinho por favor!

Cheguei na beira do mar, sentei na areia e fiquei olhando para o mar e comecei a chorar. Mentalmente começou a vir a letra, ali na hora:


"Os meus olhos coloridos
Me fazem refletir
Eu estou sempre na minha
E não posso mais fugir..."

E aí ela veio toda assim, inteira... Eu levantei rapidamente e saí correndo para que não escapasse aquilo. Cheguei em casa peguei o violão rapidinho e veio os acordes, a melodia e a canção!

Foi uma coisa de Deus, foi uma coisa de luz, espiritual, que iluminou aquela minha revolta, anestesiou a minha raiva, a minha rebeldia e me deu alegria por esta poesia tão real.


"E vagabundo pegou ele e foi preconceituoso mesmo, foi racista. De repente esses caras são tão imbecis que não perceberam o presente de certa forma que deu para uma pessoa que pensa, para um ser que respeita, para um ser que vive a vida sem frustrações , sem recalques, sem revoltas..."
(Sandra de Sá)

Essa música eu deixei lá no arquivo, pra mim. Ela foi feita pra mim, pelo meu manifesto, apenas pra mim. Eu achava que ninguém iria prestar atenção e ia dizer: "Essa música é muito ruim, essa música é muito política, essa música fala muito de preconceito... não sei o que". Mas era um preconceito, então ficou só para mim.

Eu estava numa situação realmente muito ruim, sem trabalho, sem emprego, com a mulher grávida. Então o meu sonho só restava da música. E todo mundo, quando eu entrava nas editoras, dizia: "Essa música aí tem a ver com uma cantora que está gravando um disco. Ela é Sandra Sá".

O Durval Ferreira era o diretor artístico da RGE quando ouviu "Olhos Coloridos", pegou o telefone e disse:

- Sandra vem pra cá, achei a música!

Pô, a gente ouviu e ficou maluco com "Olhos Coloridos". (Sandra de Sá)


Tive ainda a sorte maior porque o Durval Ferreira me convidou para ir ao estúdio e eu levei o violão. Quando ele me ouviu tocando ele sentiu alguma coisa diferente no meu ritmo e me botou lá no estúdio. Eu fiquei meio tímido e quando eu comecei a tocar eles ficaram assim também, mas... "que ritmo é esse?". Aí olharam para o Durval Ferreira, que estava no aquário:

- Ohhh Durval, ele está tocando diferente! Que negócio é esse?
- Não, vai na dele, é esse o ritmo aí!


"O Durval Ferreira sacou que o grande lance, o lance da música seria o Macau fazer. O Macau mandar a levada, pra mostrar: Olha, é isso! Então o que é que faz? Carrega o cara pro estúdio e 'bora' fazer!"
(Sandra de Sá)

"A gravação é maravilhosa, esse arranjo do Serginho Trombone é excepcional porque a música é muito simples, são 3 acordes, mas vai entrando os sopros, então aquilo vai criando uma atmosfera perfeita com a letra. A letra fala da negritude, da afirmação da negritude, então nada melhor do que todos os metais do sopro para reafirmar isso."

(Rodrigo Faour – Jornalista)

"Da mesma forma que o lance do violão do Macau, nas devidas proporções, essa importância desse arranjo de metais que o Serginho Trombone costurou a música toda. Quer dizer:  todo mundo se entendeu perfeitamente. "Olhos Coloridos" é isso cara, é sinal de harmonia."
(Sandra de Sá)


"Esse vinil aqui (mostrando um LP da Sandra de Sá), foi que realmente mostrou todo poder da música negra através da Sandra. Eu fico muito contente e feliz pois toda vez que eu vejo este disco sei que eu faço parte deste caminho."
(Macau)

"Olhos Coloridos se impôs como música de trabalho. Estourou geral... não tinha zona norte, oeste, leste, sul... na casa de todo mundo. Olhos Coloridos é geral!"
(Sandra de Sá)

"Toda hora que eu passava na rua ouvia tocando. Eu estava em meu barraco na Rocinha e ouvindo no barraco do vizinho "Olhos Coloridos"... E falava comigo mesmo: Está tocando a minha música!"
(Macau)



Olhos Coloridos

Os meus olhos coloridos
Me fazem refletir
Eu estou sempre na minha
E não posso mais fugir...

Meu cabelo enrolado
Todos querem imitar
Eles estão baratinado
Também querem enrolar...

Você ri da minha roupa
Você ri do meu cabelo
Você ri da minha pele
Você ri do meu sorriso...

A verdade é que você
(Todo brasileiro tem!)
Tem sangue crioulo
Tem cabelo duro
Sarará, sarará
Sarará, sarará
Sarará crioulo...

Sarará crioulo
Sarará crioulo...(2x)

Os meus olhos coloridos
Me fazem refletir
Que eu tô sempre na minha
Não! Não!
Não posso mais fugir
Não posso mais!
Não posso mais!
Não posso mais!
Não posso mais!

Meu cabelo enrolado
Todos querem imitar
Eles estão baratinados
Também querem enrolar...

Cê ri! Cê ri! Cê ri!
Cê ri! Cê ri!
Cê ri da minha roupa
Cê ri do meu cabelo
Cê ri da minha pele
Cê ri do meu sorriso...

Mas verdade é que você
(Todo brasileiro tem!)
Tem sangue crioulo
Tem cabelo duro
Sarará, sarará
Sarará, sarará
Sarará crioulo...

Sarará crioulo
Sarará crioulo...(3x)


Fonte: Por Trás Da Canção